Era uma vez um dragão menino chamado Bal que vivia numa montanha muito alta e muito verde onde havia sempre nevoeiro. Neve é que era raro, só mesmo nos meses mais frios, e mesmo assim nem todos, às vezes fazia só muito vento ou chovia e então a neve nem podia cair porque havia o perigo de derreter.
Mas o que ele adorava mesmo era aquele tempo que deixava gelo pendurado nas árvores, nos muros, nas rochas por onde a água costumava deslizar, até nas flores e nas ervinhas. Quando chegavam esses dias, o Bal só queria andar na rua, nem sentia o frio com o entusiasmo!
É que tinha sempre a esperança de encontrar aquela coisa que fazia mesmo o coração rebentar, o brilho que lhe trazia lágrimas aos olhos sem saber porquê, sem se sentir nada nada triste, pelo contrário, era mesmo uma grande alegria que lhe aquecia o corpo todo quando… via uma estrela de gelo!
Mas ficava tão contente, tão contente, que não conseguia conter um sorriso grande e muito quente, mesmo muito quente, com chamas e tudo, que derretiam qualquer estrela num abrir e fechar de olhos! E então ele ficava triste, tão triste que só tinha vontade de chorar ao colo da mãe.
Pois. O Bal, como todos os dragões, tinha o poder do fogo. E em vez de o usar em lutas contra inimigos que não tinha, porque era um dragãozinho muito bem disposto de quem todos gostavam, costumava brincar com as chamas para divertir os amigos ou aquecer o almoço. É verdade que os pais já lhe tinham dito muitas vezes que não devia brincar com o fogo, que o guardasse para quando fosse mesmo preciso, mas ele era criança e não lhes dava sempre ouvidos.
Agora, que o queria mesmo guardar, não conseguia nem por nada!
Foram tempos difíceis para o pequeno Bal. Muitas vezes passeava pela montanha com uma lágrima a crescer no olho enorme, porque sabia que se tivesse a sorte de encontrar a adorada estrela de gelo não iria conseguir evitar um sorriso daqueles e com certeza acabaria por destruí-la com a sua alegria.
Certo dia distraiu-se, com a atenção enrolada em pensamentos todos feitos de fogo e estrelas, nem se lembrou do jantar porque a tristeza lhe tirava a fome, e quando reparou já era de noite. Olhou à volta e apercebeu-se de que nunca tinha visto a montanha assim no escuro. Depois olhou para cima, onde luzia uma linda meia lua e, quando ia mesmo a virar os olhos para o chão, alguma coisa pareceu mexer-se no céu. Então, com a cara bem voltada para cima, abriu muito os olhos e viu: um brilho de estrela tão lindo como se fosse de gelo.
Havia muitas, muitas estrelas, no mesmo céu que afinal já tinha visto tantas vezes! Como é que não tinha sido capaz de reconhecer aquele brilho? Era o mesmo, a mesma alegria lhe inundava o coração, e quanto mais as olhava mais as estrelas cintilavam e exibiam a sua beleza, contentes por serem observadas assim. Então sorriu e deixou o fogo sair bem alto, quase até ao céu.
Depois correu para casa porque os pais não gostavam que voltasse tão tarde! Quando chegou, o pai fez uma cara zangada mas a mãe abraçou-o muito e quase chorava de preocupação. Quando olhou muito sério para ela nem queria acreditar: lá estava o mesmo brilho, em pequenas estrelas cintilantes que lhe dançavam nos olhos! Beijou-os muito, com cuidado para não saírem chamas, e adormeceu feliz.
No dia seguinte, por qualquer motivo brilharam de orgulho os olhos do pai, e numa poça de água cintilavam mais estrelas, até nas gotas que ficam nas flores depois de chover se viam rodopiar pontinhos de luz. Então, quando voltou a encontrar uma estrela de gelo, ficou muito contente mas sorriu calmamente, já sem chamas nem fogo, com muita alegria pela beleza do mundo.
Julieta Andrade